novembro 21, 2005

Entrevista DN de hoje - Gato Fedorento

Cinco meses depois de ter batido com a porta de Carnaxide e na altura em que lança um novo DVD, o quarteto Gato Fedorento fala do passado e do seu futuro
Passaram-se quase cinco meses desde que vocês saíram da SIC. Agora que as cabeças esfriaram admitem a possibilidade de aquele bater com a porta ter sido um pouco precipitado?

Miguel Góis (MG) - Não foi de todo precipitado. Olhando para trás, faríamos tudo exactamente igual.

Ricardo Araújo Pereira (RAP) - Com a cabeça fria, quente ou morna, a decisão era inevitável. Contratualmente, a SIC tinha toda a legitimidade para passar o programa [um conjunto de sketches antigos transmitidos no acesso ao prime time do canal generalista]. No entanto, na SIC Radical sempre nos tinham dito que o nosso orçamento era muito reduzido porque se tratava de um canal por cabo, sem dinheiro, onde se trabalhava por amor à camisola. Quando vimos o programa que estávamos a fazer com esse espírito passar na SIC generalista sem sequer sermos consultados, concluímos que aquele acordo tácito fora violado.

Só souberam que o programa ia passar na SIC generalista no própria dia?

RAP - Soubemo-lo antes, por causa da promoção do canal e de uma notícia do DN. Mas sentimos que tínhamos sido os últimos a saber. Ainda por cima, em conversas que antecederam a transmissão, nós dissemos a responsáveis tanto da SIC como da SIC Radical que a nossa posição era a de não querer que o programa passasse na SIC e agir em conformidade se tal viesse a acontecer. Há também uma questão de desgaste da marca os sketches transmitidos tinham dois anos e faziam parte do DVD mais vendido de sempre em Portugal. Foi isso que a SIC pôs a combater com os Morangos com Açúcar.

Então rescindiram o contrato.

MG - Não rescindimos porque não havia nenhum contrato. A nossa maneira de funcionar com a SIC Radical era assim.

RAP - Ao nono episódio - de um total de 13 - ainda não havia qualquer contrato assinado. Nem sequer nos tinha sido pago um tostão.

Porque é que em vez de saírem não decidiram negociar um novo contrato?

RAP - É preciso esclarecer que, antes de transmitir aqueles episódios, a SIC generalista nunca mostrou o menor interesse no Gato Fedorento. Nós nunca dissemos que não faríamos um programa na SIC. Mas isso nunca esteve em cima da mesa. Nem antes dos episódios terem ido para o ar, nem depois.

MG - De repente, nós estávamos no pior dos dois mundos. Não tínhamos nem o controlo criativo do programa que o canal por cabo oferecia, nem o dinheiro que se pode ganhar na TV generalista.

Quanto é que a SIC pagava pelo Gato Fedorento?

Zé Diogo Quintela (ZDQ) - 250 contos [1250 euros] por programa. E isso incluía salário, guarda-roupa e outras despesas de produção.

RAP - Eram 250 contos para escrevermos, interpretarmos e co-produzirmos o programa. Fomos nós que comprámos inúmeros adereços os bigodes, as cabeleiras, os óculos. Houve um episódio em que precisámos de quatro bailarinas a sério e fomos nós a pagar-lhes 120 contos [600 euros] do nosso bolso.

Esse sketch é já da segunda série. Quer dizer que continuaram a pagar-vos 250 contos ?

ZDQ - Sim. Só a terceira série, depois de aceitarmos o recurso ao product placement, é que conseguimos que fosse mais bem paga.

Quanto?

ZDQ - Quatro vezes mais. Pode parecer um grande aumento, mas não é, pois o que nos pagavam antes nem sequer era um valor ridículo - era uma palhaçada. Só com o dinheiro que a SIC ganhou com o nosso primeiro DVD paga as três séries do Gato Fedorento, e sobra dinheiro.

Na base da vossa saída esteve um conflito com Manuel Fonseca. Agora que ele saiu da SIC e foi substituído por Francisco Penim, anterior director da SIC Radical, admitem a possibilidade de regressar à estação?

TD - Essa pergunta parte do princípio que o nosso problema foi mais com o Manuel Fonseca do que com o Francisco Penim.

Não foi?

TD - Tenho dúvidas. Eu compreendo que o Manuel Fonseca, olhando simplesmente para o contrato que nós tínhamos com a SIC, tomasse a decisão de passar o Gato Fedorento na SIC generalista. Quem conhecia a nossa ligação à SIC Radical e o acordo de princípio que existia era o Francisco Penim. Ou seja, no momento em que o Manuel Fonseca decide passar o Gato Fedorento na SIC, quem estaria em condições ideais para dizer "calma, isso não pode ser feito assim" era o Francisco Penim.

E não o fez?

TD - Aparentemente não o fez. E mesmo nas reuniões que teve connosco nunca deu a entender que o tivesse feito.

RAP - Da maneira como esta questão está a ser colocada parece que tivemos um problema pessoal com o Fonseca ou com o Penim. O que nós tivemos foi um problema institucional com a SIC. As questões pessoais não são interessantes ...

Podem sê-lo se vocês se imaginarem a voltar a Carnaxide...

TD - Nós nunca fomos convidados a regressar.

Depois da ruptura ninguém vos disse "voltem, vamos resolver isto"?

Todos - Não, nunca.

RAP - A SIC é o único canal generalista que nunca manifestou nenhum interesse em nos contratar, quer no tempo do Manuel Fonseca, quer no tempo do Francisco Penim.

Já depois da vossa saída, Francisco Penim deu uma entrevista ao Diário de Notícias em que afirma o seguinte "Sou amigo dos Gatos. Eu lembro-me do dia em que os Gatos chegaram à SIC com uma mão à frente e outra atrás e me disseram: 'Eh, pá, vê lá se isso tem piada...' Não me esqueço." Querem comentar?

MG - Essa frase do chegar à SIC "com uma mão à frente e outra atrás"... Nós só conseguimos fazer o Gato Fedorento com o preço que a SIC Radical nos propôs porque tínhamos uma situação muito confortável como guionistas, nomeadamente para os programas do Herman e da Maria Rueff. De outra forma, teria sido impossível.

RAP - Eu acho, aliás, um bocadinho deselegante ter de justificar se naquela altura eu era ou não um vagabundo. Quem me acusa de estar com uma mão à frente e outra atrás obviamente desconhecia a minha situação financeira.

Tendo em conta que o Francisco Penim se assume como vosso amigo, foi o final de uma bela amizade?

RAP - Na verdade, nunca fui amigo do Francisco Penim, embora também não seja seu inimigo. A relação que nós temos é cordata, simpática, mas não se lhe pode chamar amizade, a não ser num entendimento muito vasto da palavra. Como diz o treinador do Benfica, eu não o convido para a minha festa de anos, nem ele me convida para a dele. Nós chegámos à SIC Radical através de um convite do Fernando Alvim, que nos viu a fazer stand-up e nos convidou para o seu programa [O Perfeito Anormal]. Esses sketches evoluíram depois para um programa de 25 minutos. Em momento algum fomos ter com o Francisco Penim a perguntar-lhe "vê lá se isto tem piada".

Quando é que os Gatos vão regressar à televisão?

RAP - Seguramente não até ao fim deste ano, por opção própria. Estamos inteiramente dedicados a escrever a nova série. Acabámos por anular todos - ou quase todos - os trabalhos nas Produções Fictícias. Já não escrevemos para o Herman, já não escrevemos para A Bola. Tirámos uma sabática, porque queremos continuar a evoluir.

Tendo em conta que não foram convidados para regressar à SIC, sobram duas estações - a RTP e a TVI. Tiveram contactos com as duas?

RAP - Sim, tivemos contactos. Ambas manifestaram interesse.

Para qual estão mais inclinados?

RAP - A única coisa que podemos dizer é que ainda não há nenhum contrato assinado.

Uma revista de televisão falou de um jantar com Nuno Santos [director de programas da RTP].

ZDQ - Foi um jantar informal à saída dos prémios MTV. Uma amiga comum convidou-nos e encontrámo-nos no restaurante.

Fazem questão de não abdicar do controlo criativo do programa?

TD - Sim. E isso restringe o nosso leque de opções.

No DVD que agora lançaram há um sketch violentíssimo sobre Luís Filipe Borges, que já foi vosso colega nas Produções Fictícias. Na altura, esse sketch criou viva polémica no meio, mas o Luís Filipe Borges não era ainda uma figura pública. Hoje tem o seu próprio programa de televisão [A Revolta dos Pastéis de Nata, na 2]. Não pensaram retirar o sketch do DVD?

TD - Não. Aquilo é sobre um tipo, sobre uma personagem...

RAP - ...Que é o Neruda. Aquela história da boina é o Pablo Neruda. Vamos lá ver nós temos vários sketches baseados em familiares, em pessoas que conhecemos.

Mas hão-de admitir que aquele é particularmente agressivo.

RAP - Dizes isso porque não conheces a minha tia Fernanda e a carga de pancada que ela leva no sketch "Estava balofa".

Não colocaram a hipótese de o retirar?

MG - Seria esquisito, porque nós nunca retirámos nenhum sketch.

ZDQ - Nem sequer aqueles que achamos que estão mal.

Isso leva-nos à questão dos egos em projectos colectivos como o vosso, com pessoas talentosas, cujo protagonismo se traduz em dinheiro. Como é que resolvem isso entre vocês?

TD - Nós fomos todos a operar e extraímos os egos. Eu aproveitei e tirei também o apêndice.

ZDQ - Isto é como no futebol. Tens uma equipa onde sobressaem as qualidades de cada um e onde os defeitos podem ser mais facilmente abafados pela força do colectivo.

Peguemos no caso da publicidade do Ricardo ao Montepio Geral. Como é que vocês geriram isso? O Ricardo dividiu o dinheiro pelo quatro?

RAP - Lamentavelmente, não.

Mas receberam algum?

TD - Não, nem tínhamos de receber. Ele é o autor do texto e foi ele quem protagonizou o sketch.

ZDQ - Por acaso, o casaco era meu e os óculos do meu pai. Nunca mais vi o casaco. E gostava dele. Era quentinho.

RAP - Num outro grupo isso poderia ser uma coisa problemática. Mas nós somos todos team players e amigos desde antes do Gato Fedorento. Conhecemo-nos muito bem. Isto não é um casamento de conveniência.

TD - Senão éramos os D'ZRT.

ZDQ - Se os Beatles não tivessem existido, os quatro isoladamente poderiam nunca ter ido a lugar algum. E não estou a comparar-nos com os Beatles, porque nós não temos nenhum Ringo Starr. Aqui é só nata. (Risos)

2 comentários:

Geraldes disse...

epá, o que é isto!!!!Achas k alguém vai ler isto.........

Snitarol disse...

epá, mete mas é os olhos em Bico, perdão, no Bico